Mercado Público vira Cult aos sábados
Matéria de Zero Hora destaca pesquisa do Sindpoa
Matéria de duas páginas com chamada de capa do jornal Zero Hora de sábado passado dá merecido destaque para a iniciativa do Sindpoa de promover uma pesquisa no mercado público. Veja a íntegra da reportagem assinada pelo jornalista Nilson Mariano.
Os cabelos alinhados com gel e o rosto liso de tão escanhoado, o garçom Jorge Luiz da Luz, 26 anos, ajeita o nó da gravata borboleta, cujas abas negras contrastam com o branco engomado da camisa de mangas compridas. Tanto esmero se justifica. Por que hoje é sábado, ele atenderá a clientes especiais.Não que Jorge Luiz capriche menos nos demais dias da semana. Prova disso são os altos índices de satisfação registrados em uma pesquisa das Faculdades Rio-grandenses (Fargs) e do Sindicato da Hotelaria e Gastronomia de Porto Alegre (Sindpoa), feita entre 11 e 16 de abril (veja na página ao lado).Mas é aos sábados que o velho Mercado Público recebe fregueses com mais tempo para saborear o almoço. Por isso, Jorge Luiz usa a gravata borboleta:
“No sábado, o público é diferente”. A percepção dele é a mesma entre comerciantes, garçons, atendentes e frequentadores. Construído há 142 anos, em forma de quadrilátero, o Mercadão entrou na agenda dos melhores programas de sábado. Retomou o charme de antes, quando era uma referência para compras e gastronomia. Popular nos dias úteis, tornou-se cult aos sábados.E está agradando. A estudante Júlia Puffal, 24 anos, precisava achar um lugar aprazível para mostrar a um amigo de São Paulo, o engenheiro de computação Denis Carnietto, 32 anos. Sentaram-se no segundo andar, a mesa tendo por moldura um janelão por onde se infiltrava um raio oblíquo de sol. Denis aproveitou para levar um quilo de erva-mate. “Costumo tomar chimarrão em São Paulo” diz o visitante.
Existem turistas que vêm do além-mar. O indiano Arugunan Mariaraj, 32 anos, engenheiro, pediu que seu anfitrião, João Zago, 36 anos, o fotografasse diante de uma vaca remanescente da CowParade, na entrada do Mercado. O animal é sagrado na Índia, Arugunan quis registrar a lembrança. “Percebi um sentimento histórico e tradicional aqui”, comenta. E tem de tudo no Mercadão. Há banca que vende café em grãos para moer em casa. Apetrechos para o chimarrão e o churrasco. Chás para todos os males, temperos para todas as panelas. Ração para cães, gatos, peixes e pintos. Embutidos, linguiças e charque. Quer uma cachaça tipo exportação? Pois tem. O comerciante Oreste Gabardo, 68 anos, oferece mais de 500 rótulos de aguardentes brasileiras. A mais cara custa R$ 460 a garrafa. “Nos sábados, a clientela é das classes A e B. Metade já sabe o que vai comprar” conta. Sábado é dia de vender gostosuras. Atendente de uma banca de especiarias, Danilo Schaeffer dos Santos, 42 anos, já sabe que os fregueses buscam presunto parma, pasta de berinjela, geleias, pistache, figo turco e iraniano, vinhos, damascos, azeitonas, mostardas.
“E o nosso movimento vai até o fim da tarde. Antes, terminava pelas 13h” acrescenta. Luís Carlos Volcan, 58 anos, tecnólogo em cooperativismo, faz seu rancho sem pressa. Não só compra, passeia. Enquanto se abastece de queijos – parmesão, gorgonzola e mussarela –, contempla as prateleiras transbordando de mercadorias e o vaivém das pessoas.”Gosto de ver essa energia de mercadorias e de trabalho. O Mercado recupera a memória de uma feira de compras, de um ponto de encontro das pessoas” diz Volcan.
É o que fez a professora Graziela Ramalho, 38 anos. Acompanhada de nove familiares e amigos, inclusive um casal de Brasília, foi ao Mercado para almoçar num dos tradicionais restaurantes. Enquanto aguardava uma mesa, consultava o cardápio.”Vale esperar, a comida é de qualidade” ressalta a professora. Henrique Schumacher, 54 anos, também elegeu o Mercado para se reunir com amigos. Em um sábado, ao lado da mulher, Lígia, 52 anos, encontrou-se com um casal para degustar uma feijoada, regada a caipirinha. Levou junto o neto, Mateus, quatro anos, que se esbaldou pelos corredores, espiando entre as pilastras. O que o menino não entendeu foi uma antiga placa, cujo aviso perdeu o sentido:
– É proibido lançar cascas de frutas ou lixo nos passeios. Multa pela infração: 20$000.Ir ao Mercado Público é se misturar a uma colmeia de pessoas, inebriar-se de aromas. Então, fica o convite: sente-se a uma mesa com tampo de mármore, tome um café demoradamente, coma um bolinho de bacalhau, sinta-se hóspede temporário do século 19.